quarta-feira, 26 de julho de 2023

A data do seu aniversário

Não lembrei do seu aniversário. Todos os anos você me diz: você esqueceu mais uma vez. Sim, esqueci novamente e me desculpe. Minha cabeça anda vagando por lugares que nem eu mesma consigo acompanhar. Mas agora me peguei pensando: Será que hoje em dia as pessoas realmente decoram as datas de aniversário? Anotam em uma agenda? Colocam avisos, alarmes e lembretes? Ou só lembram quando os outros atualizam algo nas redes sociais? Duvido muito que se eu ficasse em silêncio no dia da comemoração do meu nascimento alguém se daria o trabalho de lembrar. Menos você. Você eu sei que lembraria. Desculpe. Esqueci do seu aniversário. 

Esqueci porque as memórias que carrego de ti ainda me doem e corro contra elas. Tento viver no contraste de manter as boas lembranças intactas, mas tenho um sério problema com memória, principalmente agora perto dos trinta. A nostalgia em excesso me adoece. Me faz perder a noção do limite dos meus excessos sentimentais. Me apaixono muito fácil e nunca esqueço quem amei. Ao mesmo tempo que essa é minha maior qualidade, é o meu maior defeito. Excessos de saudade em níveis lúdicos me adoecem. A liberdade é uma prisão. A saudade me incentiva a correr pelo mundo, atravessando o passado buscando entender porque raios não nos ouvimos com o peito aberto e não sentamos para conversar? Sim, eu não lembrei do seu aniversário. Não por maldade, mas porque na época você insistia em aparecer quando eu mais precisava de silêncio para me entender. Afinal quem se entende minimamente aos 16 anos? Sempre fomos contrastes perigosos, o tal da “coisa” que aparece quando menos espero você. Apareceu hoje. Pensei em você.

Quando mais precisei compreender meus sentimentos, você me invadia com palavras e sentimentos mergulhados em golpes doloridos. Éramos dois adolescentes em uma constante fuga que hoje completa mais de treze anos. Fuga do mundo, fuga de nós mesmos. Mas arrisco em dizer que hoje nos encontramos um pouco, cada um da sua forma e movimento. Confesso que as suas ligações de madrugada no meio da rua me adoeciam, de nervoso e de saudade. Eu ficava com você virando a madrugada conversando até você se acalmar e lembrar o quanto te amava. Mas ao desligar era eu quem precisava de colo e calma. Quem me amava na minha vulnerabilidade? Aprendi a me acalmar sozinha. Foi assim que a memória começou a falhar. Esqueci dos detalhes, menos do cheiro do cigarro. Esse até hoje a minha rinite faz questão de lembrar. Me forcei a esquecer de tudo para poder seguir em frente. Confesso que até anotei no bloco de notas, mas faz tempo que não lembro de me atualizar na lista. Digo, não estou justificando. Mas esqueci do seu aniversário. 

Mas quero que saiba que ainda guardo todos os presentes que você me deu.  Inclusive o porquinho - que parou de grunhir de tanto apertar e os papéis de bala que você me dava todos os dias pela manhã. Nunca esqueci o sabor da bala, pois lembrava que era a mesma do nosso beijo: morango. Feliz aniversário com quase dois meses de atraso. 22h15 de uma quarta-feira. Finalmente, lembrei que foi o seu aniversário.