quinta-feira, 23 de setembro de 2021

o silêncio das entrelinhas de uma noite sufocante.

O medo corroeu meu rosto por horas, como há anos não sentia na pele.
Paralisei. Como sempre paraliso no medo.
A voz alta, o tato descontrolado, os seus olhos arregalados corroendo o meu ser.
O que tanto a vida insiste para que isso continue? O que tenho de aprender com tudo isso? Essa repetição de karmas e violências gratuitas em minha vida. O que mais será necessário aturar nessa vida para chegar na tal evolução? 
Ali fiquei por quase uma hora, em pé - ou mais. Provavelmente mais. De boca aberta e olhos brilhantes, com lágrimas ameaçando a saltar dos olhos. Minhas mãos tremiam e quase que em movimentos repetitivos, elas arrancavam pele por pele em volta dos dedos. Mais uma das várias crises de ansiedade que instalaram em mim sem consentimento. Nem minhas lágrimas tinham coragem de cair com a gravidade, como se fosse um próprio conforto segurá-las em mim mais um pouquinho. 
Senti minha panturrilha formigar em uma mistura de medo e desespero, fiquei por horas parada. Medo de sair. Esse tal de silêncio paralisante me possuiu novamente de tal forma que não conseguia pensar em mais nada a não ser: Por quê isso novamente?
O que há de tão magnífico nesse poder exacerbado dos outros sobre o meu ser? É excesso de liberdade? Excesso de sinceridade? Essa necessidade de afirmação como algo negativo do quão imaginativa sou sobre minhas próprias narrativas de vida. Eu me invento, para sobreviver.
Mas confesso que ando cansada. Sinto que ultimamente estou apenas cumprindo as obrigações por aqui. Preenchendo a tabela da vida. Seguindo em um corpo que me serve como abrigo e morada diante do caos em meu peito. Vivo em um completo segredo misterioso. Talvez o meu maior segredo perante a todos, seja justamente viver no equilíbrio no caos de minha vida. Como consigo ter a essência poética em meio ao caos? Em meio a esse ódio descontrolado por todos. Talvez isso seja a razão da arte. A necessidade do movimento. Transformar o ódio em teatralidade e poesia. 
Ou o excesso, o movimento de transbordar vontade de viver, talvez. 
Essa pressa, essa vontade selvagem de viver a cada segundo... No fundo, sinto pela intuição que vou embora da festa mais cedo. Entende-me? Por isso a morte me assombra tanto em vida. Por isso dou risada da cara do perigo, eu já estou certa do destino final. Apenas crio narrativas mais reconfortantes para afirmar o que já sei. Mas saiba que, paraliso quando chega o limite. A voz alta para mim é totalmente corrosiva. Ela ativa todos os gatilhos inimagináveis de meu ser. Me encolhe, me distorce, me enfraquece. Não sinto meu corpo. Ou será que eu mesma fujo dele por alguns minutos? Onde está minha consciência? Para onde fujo nestes momentos? Para onde foi a incrível autora dessa história?
Nada mais é tão agressivo quanto o balanço de dedos perto do rosto. Caso não tenham a memória corpórea sobe isso, ignorem e agradeçam. É uma benção uma vida sem caos. Saibam apenas que o tempo passa lento... quase como uma eterna espera dos créditos finais, aquele suspense antes da queda do protagonista. Entendo o desespero feminino. Por anos compreendo em silêncio. Mas para quem ou onde materializar toda essa experiência? O mundo não quer nos ouvir. É uma bagagem inútil silenciosa que carregamos durante a vida. 
O que realmente me deixa confusa é perceber por onde exalo tanto amor? De onde vem essa imensa vontade de viver apesar de tudo. Apesar deles. Apesar de mim. Apesar das histórias e vivências?
Amo minha companhia, minhas ideias dançantes sobre a mesa, os rabiscos apaixonados em uma carta sem remetentes, em post it's espalhados com frases delirantes.
Amo me apaixonar pela vida, pelas coisas, pelas obras, pessoas e animais. 
Amo o que me move como artista. 
Talvez o grande segredo por trás dos escritos, seja a própria experiência do autor. A verossimilhança das histórias com a vida real. Essa mistura poética do mistério de um desabafo entrelinhas que se torna publicável. Que triste não podermos ser realistas com a própria realidade. A realidade é uma mentira inventada. O bom é que ninguém realmente saberá ao certo de onde surgem tantas inspirações para tais histórias, ou qual delas de fato é apenas um relato documental. Bendita seja a poesia. 
Talvez por isso o destino dos escritores. Talvez este seja o meu. Eu presto socorro a minha almas nas entrelinhas. Só quem realmente conhece a essência do autor, consegue observar os percursos sinceros em sua magnitude. Meu amor é através da subjetividade. Eu sublinho o que realmente quero dizer. Eu me declaro em pequenos símbolos. Eu sonho em pequenos verbos. Eu me reconstruo ao verbalizar o caos. Eu me reconheço e me inspiro adaptando meus próprios textos, mesmo sem publicá-los. Mais de 400 rascunhos espalhados por aí. 
O que seria de mim sem a arte? Sem o poder da palavra, das metáforas e dos sonhos.
Sinto que não pertenço ao aqui agora. É puro fruto da passagem. Sinto que a vida ainda me trará a paz necessária para simplesmente conseguir ser quem eu realmente sou... uma poesia anônima ambulante.